Hoje morri pela primeira vez.
Uma morte curta
contei segundos
fui relógio à procura do fim do tempo
e ajoelhei-me
vergado por uma chicotada
que se enrolou na cabeça
e deixou os olhos confusos
vendo os telhados no chão
as portas com entradas para o céu
e as janelas, todas circulares
em rodopios encaixilhados.
Uns segundos onde o mundo
coube todo no meu peito,
uns segundos
onde as despedidas correram
as faces todas da vida.
Redemoinhando como um louco
hoje morri pela primeira vez
uma morte curta
contei segundos
e pedi para te poder ver
só mais uma vez.
Nuno Guimarães faleceu a 30.4.2013- subitamente
Vieira da Silva
"Poema é toda a página aberta diante de mim, caligrafada de esperança e de calma."
Miguel Torga, Portugal
_____________
E em Lisboa capital
dos novos mestres de Aviz
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis.
Mesmo que tenha passado
às vezes por mãos estranhas
o poder que ali foi dado
saiu das nossas entranhas.
Saiu das vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
Mesmo que seja com frio
é preciso é aquecer
pensar que somos um rio
que vai dar onde quiser
pensar que somos um mar
que nunca mais tem fronteiras
e havemos de navegar
de muitíssimas maneiras
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
volta à barriga da mãe.
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu.
Ary
No silêncio morno das coisas do meio-dia
Eu me esvaio no aniquilamento dos agudíssimos do violino
Que a menina pálida estuda há anos sem compreender.
Eu sinto o letargo das dissonâncias harmônicas
Do vendedor de modinhas e da pedra do amolador
Que trazem a visão de mulheres macilentas dançando no espaço
Na moleza das espatifadas da carne.
Eu vou pouco a pouco adormecendo
Sentindo os gritos do violino que penetram em todas as frestas
E ressecam os lábios entreabertos na respiração
Mas que dão a impressão da mediocridade feliz e boa.
Que importa que a imagem do Cristo pregada na parede seja a verdade...
Eu sinto que a verdade é a grande calma do sono
Que vem com o cantar longínquo dos galos
E que me esmaga nos cílios longos beijos luxuriosos...
Eu sinto a queda de tudo na lassidão...
Adormeço aos poucos na apatia dos ruídos da rua
E na constância nostálgica da tosse do vizinho tuberculoso
Que há um ano espera a morte que eu morro no sono do meio-dia.
Rio de Janeiro, 1933 Vinicius
Hum,... Estais Inspirado P'los vistos...
Andais vós em circunferência
em busca da matemática
Coisa dinâmica não estática
Qual Arquimedes aos riscos cálculos e coriscos?
E numa área em que o circulo
Será todo em circunferência
Inventando a influencia
De uma simples letra grega
E que dizem ser o PI,
Embora em números se escreva?
AccB
Lembro-me agora que tenho de marcar um encontro contigo, num sítio em que ambos nos possamos falar, de facto, sem que nenhuma das ocorrências da vida venha interferir no que temos para nos dizer.
Muitas vezes me lembrei que esse sítio podia ser, até, um lugar sem nada de especial, como um canto de café, em frente de um espelho que poderia servir até de pretexto para reflectir a alma, a impressão da tarde, o último estertor do dia antes de nos despedirmos, quando é preciso encontrar uma fórmula que disfarce o que, afinal, não conseguimos dizer.
É que o amor nem sempre é uma palavra de uso, aquela que permite a passagem à comunicação mais exacta de dois seres, a não ser que nos fale, de súbito, o sentido da despedida, e cada um de nós leve, consigo, o outro, deixando atrás de si o próprio ser, como se uma troca de almas fosse possivel neste mundo.
Então, é natural que voltes atrás e me peças:«Vem comigo!», e devo dizer-te que muitas vezes pensei em fazer isso mesmo, mas era tarde, isto é, a porta tinha-se fechado até outro dia, que é aquele que acaba por nunca chegar, e então as palavras caem no vazio, como se nunca tivessem sido pensadas.
No entanto, ao escrever-te para marcar um encontro contigo, sei que é irremediável o que temos para dizer uma ao outro: a confissão mais exacta, que é também a mais absurda, de um sentimento; e, por trás disso, a certeza de que o mundo há-de ser outro no dia seguinte, como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos encontrar; que há-de ser um dia azul, de verão, em que o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas, que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros.
in «Poesia Reunida 1967-2000», prefácio de Teresa Almeida, Dom Quixote, Lisboa, 2000
Espreito por uma porta encostada
Sigo as pegadas de luz
Peço ao gato "xiu" para não me denunciar
Toca o relógio sem cuco
Dá horas à cusquice das vizinhas e eu
Confesso às paredes de quem gosto
Elas conhecem-te bem
Aconhego-me nesta cumplicidade
Deixo-me ir nos trilhos traçados
Pela saudade de te encontrar
Ainda onde te deixei
Trago-te o beijo prometido
Sei o teu cheiro mergulho no teu tocar
Abraças a guitarra e voas para além da lua
Amarro o beijo que se quer soltar
Espero que me sintas para me entregar
A cadeira, as costas, o cabelo e a cigarrilha
A dança do teu ombro...
E nesse instante em que o silêncio
É o bater do coração
Fecha-se a porta
Pára o relógio
As vizinhas recolhem
Tu olhas-me...
Tu olhas-me...
Trago-te o beijo prometido
Sei o teu cheiro, mergulho no teu tocar
Abraças a guitarra e voas para além da lua
Amarro o beijo que se quer soltar
Espero que me sintas para me entregar
A cadeira, as costas, o cabelo e a cigarrilha
A dança do teu ombro...
E, nesse instante em que o silêncio
É o bater do coração
Fecha-se a porta
Pára o relógio
As vizinhas recolhem
Tu olhas-me...
Tu olhas-me...
Espreito por uma porta encostada
Sigo as pegadas de luz
Os poetas têm no gesto
aquele traço lento da escrita
Como se dançassem nas letras
Ou pendurassem os pensamentos no olhar das palavras
Não sabem o que vão escrever
Mas escrevem
As mãos pegam nas palavras e escrevem
Os olhos ficam em espera
Como se o pensamento nem ditasse a forma
Os poetas têm aquele gesto lento
De quem guarda um segredo que não sabe
O gesto lento de quem espera
Mesmo que a espera seja já ali
ou só na eternidade.
ACCB
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